Na verdade, dá que pensar, que recomendações feitas pela Direção Geral da Saúde quando à festa do Avante, no âmbito do combate à pandemia, possam ser mantidas secretas.
Pelo contrário, deveriam ser divulgadas para que o público e os participantes as conhecessem e adequassem o seu comportamento de acordo com as mesmas.
Alguém percebe a utilidade deste secretismo, quando se trata da proteção da saúde de todos nós?
Perguntaram-lhe há poucos dias, como tinha vivido o seu confinamento, «lá se passou», disse, mas naquele momento, ela lembrou-se, sobretudo do seu desconfinamento.
Depois de semanas isolados em casa, a sair apenas para comprar víveres, ir à farmácia ou levar a cadela à rua, surge um dia em que um dos filhos propõe ao grupo familiar um encontro no grande parque lisboeta Eduardo VII.
E assim se fez. Cada casal sentado na relva, no seu canto, todos ainda suficientemente distanciados uns dos outros. Mas já se podiam ver e falar ao vivo. E mais importante, respirar a primavera. Porém, nada de proximidades.
Contudo, no meio da tarde, eis que o neto, petiz que parecia apenas interessado nas brincadeiras dos cães e dos patos no lago, se aproxima com uma minúscula flor na mão para lhe oferecer.
Depois de muitas marcações e desmarcações, conseguiram finalmente as duas irmãs ir visitar a mãe internada num lar. Já não a viam há meses.
Primeiro as visitas tinham sido proibidas pelos perigos da pandemia, depois tinha aparecido uma auxiliar da cozinha infetada com covid, depois nova precaução com qualquer outra coisa, tudo tinha adiado a visita. Recebiam notícias e iam falando pelo telemóvel, com câmara, mas não era a mesma coisa.
A mãe ainda as conhecia e ficava sempre contente de as ver. Em regra, davam depois as três, uma voltinha de carro e muitas vezes iam almoçar ou lanchar em lugares conhecidos. Era assim a sua rotina de fim de semana.
Naquele domingo iam estar juntas. Mas nada de abraços, nem proximidades, haveria um acrílico a separar as visitas.
A mãe toda arranjada ao ver as filhas, perguntou-lhes alvoraçada, «se sempre podiam sair um bocadinho?» Aí uma delas respondeu, «não mãezinha, ainda não pode ser hoje o nosso almoço, fica para a próxima...»
Que próxima, quando seria esta próxima e chegaria a haver uma próxima para elas? Acalmaram a mãe o melhor que puderam e saíram as duas a esconder as lágrimas o melhor que conseguiram.